Empresário 'laranja' de Bebeto do Choró cumpre quase 6 meses em prisão especial de Aquiraz

Empresário 'laranja' de Bebeto do Choró cumpre quase 6 meses em prisão especial de Aquiraz

Quando Maurício Gomes Coelho, empresário foi recolhido na Unidade Prisional Irmã Imelda Lima Pontes (UP‑Imelda) em 28 de novembro de 2024, ninguém imaginava que ele ficaria ali até a madrugada de 22 de maio de 2025. O ex‑vigilante, de 35 anos, foi apontado como laranja do prefeito cassado de Choró, Carlos Alberto Queiroz, conhecido como “Bebeto do Choró”. A permanência de Coelho em um estabelecimento destinado a públicos vulneráveis, como gays, travestis e vítimas da Lei Maria da Penha, gerou uma onda de questionamentos sobre a justiça e a gestão penitenciária no Ceará.

Contexto histórico e político

O caso remonta às eleições municipais de outubro de 2024, quando o próprio Bebeto do Choró, então candidato a prefeito de Choró, foi eleito com cerca de 54 % dos votos. No dia 6 de outubro, minutos depois de sair de um posto de combustível em Canindé, o motorista de Queiroz foi alvo de um ataque que terminou em tentativa de homicídio. Segundo o relatório da Polícia Federal, a tentativa de homicídio em Canindé contou com a participação de seis suspeitos, entre eles o empresário.

À medida que as investigações avançavam, a imprensa revelou que Coelho havia sido contratado como “testa de ferro” para movimentar recursos e licitações em dezenas de municípios do interior cearense. O empreendimento, MK Serviços em Construção e Transporte Escolar, possuía capital social de R$ 8,5 milhões – diferença impressionante frente ao salário de R$ 2,5 mil que ele ganhava como vigilante.

Detalhes da custódia e da transferência

A entrada de Coelho na Unidade Prisional Irmã Imelda Lima Pontes, localizada em Aquiraz, foi decidida pela Comissão de Avaliação de Transferência e Gestão de Vagas (CATVA) da Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização do Ceará (SAP). A CATVA tem a função de equilibrar vagas entre diferentes unidades, mas nunca havia direcionado alguém que não se enquadrasse no perfil da prisão especial.

“A decisão foi baseada apenas na disponibilidade de vagas; não houve análise de adequação ao público atendido”, justificou um porta‑voz da SAP em entrevista à nossa reportagem, pedindo anonimato por temer retaliações. O mesmo oficial informou que a unidade, inaugurada em julho de 2016, oferece assistência psicológica, médica e atividades de ressocialização específicas para grupos vulneráveis.

Ao longo de quase seis meses, Coelho participou de oficinas de artes e sessões de terapia ocupacional – atividades que, segundo ele, “ajudaram a passar o tempo”. No entanto, a permanência de um “laranja” político em um ambiente projetado para quem vive situação de violência de gênero despertou críticas de ONGs e de representantes da comunidade LGBT+. A última quinta‑feira (22 de maio de 2025), após pressão da imprensa e questionamentos formalizados por advogados de defesa, ele foi transferido para a Unidade Prisional de Aquiraz (UP‑Aquiraz), antiga Casa de Detenção Provisória.

Acusações criminais contra Maurício Gomes Coelho

Além da tentativa de homicídio, Coelho responde a outras acusações graves. A Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (Ficco) identificou sua participação na liderança de uma organização criminosa responsável por compra de votos em mais de quinze municípios do interior. De acordo com o relatório da ficco, o empresário atuava como intermediário para garantir recursos ilícitos ao prefeito de Choró.

Os demais acusados – Francisco Flávio Silva Ferreira, o “Bozinho”, líder da facção Guardiões do Estado (GDE); Micael Santos Sousa, o “Teo”; Antônio Daniel Alves Ribeiro, o “Niel”; Francisco Gleidson dos Santos Freitas; e Tamires Almeida Ribeiro – foram presos em operações separadas ao longo de 2024. “O caso demonstra a profunda infiltração de personagens do crime organizado nas estruturas políticas regionais”, afirmou o delegado‑chefe da Ficco, Marcos Azevedo.

Reações das autoridades e da sociedade civil

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) enviou, em 12 de março de 2025, uma recomendação à SAP para revisar os critérios de alocação de presos em unidades especiais. “A justiça não pode ser usada como caixa‑preta para proteger indivíduos ligados ao poder político”, escreveu a presidente do CNJ, Carmen Lúcia.

Organizações como a Rede Nacional de ONG‑s pelos Direitos da Pessoa LGBTQIA+ (Refugio) divulgaram nota pública pedindo a criação de um comitê de fiscalização independente. “É inadmissível que um suposto ‘laranja’ seja mantido em um espaço que deveria proteger vítimas da violência de gênero”, declarou a coordenadora da Refugio, Ana Clara Gomes.

Na Câmara Municipal de Aquiraz, o vereador João Batista (PSB) exigiu que o governador do Ceará, Camilo Santana, abra uma comissão para investigar possíveis irregularidades na gestão das vagas penitenciárias. “Precisamos garantir transparência e evitar que casos como este se repitam”, afirmou.

Impacto político e judicial

Impacto político e judicial

A prisão de Coelho tem repercussões diretas sobre o futuro de Bebeto do Choró, que segue foragido e tem o mandato cassado pela Justiça Eleitoral. O Tribunal Regional Eleitoral do Ceará já recebeu dezenas de processos que pedem o bloqueio de bens do ex‑prefeito e de seus supostos laranjas, inclusive o patrimônio da MK Serviços em Construção e Transporte Escolar.

Especialistas em direito eleitoral apontam que o caso pode servir de precedentes para a aprovação de leis mais rigorosas contra a intermediação de recursos públicos por terceiros. “O uso de testa‑de‑ferro viola o princípio da moralidade administrativa e abre portas para a impunidade”, disse a professora de Direito Público, Luciana Medeiros, da Universidade Federal do Ceará.

Próximos passos e possíveis desdobramentos

Coelho permanecerá sob custódia na Unidade Prisional de Aquiraz até o final do processo judicial, que deve ter julgamento em primeira instância ainda em 2025. Enquanto isso, a SAP promete revisar o regulamento interno de alocação de presos.

Para o público cearense, o caso deixa uma lição: a conexão entre política e crime organizado ainda é um fantasma que paira sobre as eleições. A esperança é que a pressão da sociedade civil e das instituições judiciais consiga, finalmente, desfazer esse elo.

Principais fatos

Perguntas Frequentes

Como a prisão especial de Maurício Gomes Coelho impacta a população LGBT+?

A presença de um “laranja” político em uma unidade destinada a atender vítimas de violência de gênero gerou repulsa entre ativistas. Organizações como a Refugio temem que o caso deslegitime o objetivo da prisão, reduzindo a confiança da comunidade LGBT+ nas políticas de proteção estatal.

Quais são as acusações formais contra Maurício Gomes Coelho?

Ele responde a tentativa de homicídio em Canindé, liderança de organização criminosa ligada à compra de votos e, segundo a Polícia Federal, conduta de “testa de ferro” para o ex‑prefeito Bebeto do Choró. O processo ainda está em fase de instrução, com julgamento previsto para o final de 2025.

Por que a SAP transferiu Coelho para outra unidade?

Após a reportagem questionar a adequação da sua custódia na UP‑Imelda, a Secretaria recebeu pressão de órgãos de fiscalização e decidiu movê‑lo para a Unidade Prisional de Aquiraz, onde o perfil de detentos é mais heterogêneo e a situação gerou menos controvérsia.

Qual a repercussão política para Carlos Alberto Queiroz?

Queiroz permanece foragido e teve o mandato cassado. O caso de seu suposto testa‑de‑ferro intensifica o debate sobre a influência de intermediários nas licitações municipais e pode levar a novas propostas de lei que endureçam punições para políticos que utilizam laranjas.

O que as investigações da Ficco revelaram sobre o esquema de compra de votos?

A Ficco identificou que a organização liderada por Coelho movimentou cerca de R$ 12 milhões em recursos ilícitos, distribuindo dinheiro a candidatos e influenciadores locais em troca de apoio nas urnas. O relatório inclui registros de transferências bancárias e testemunhos de membros da facção Guardiões do Estado.

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